sexta-feira, 29 de julho de 2011

O silêncio do rio...

No carnaval passado imergi no cerrado. Uma parte de mim queria festa, mas acabei respeitando a outra parte que falava mais alto: a que queria calar para ouvir a natureza.
Passei quatro dias prestando atenção em cada mensagem que pudesse surgir.
O que me angustiava àquela época era o silêncio, não o meu, o do outro... Tenho uma dificuldade com a ausência de palavras e manifestações verbais alheias.
Um dia recebi a orientação de me conectar e pedir uma resposta sobre o que eu quisesse. Me deixei levar e quando vi estava sentada à margem de um córrego pequeno. Me abri para ouví-lo. A primeira coisa que ele me disse foi: "estou serenamente indo em frente, sem cessar - esse é o meu destino". Fiquei ali ouvindo o barulho leve que ele fazia enquanto caminhava, e ele continuou:  "Levante-se e me acompanhe, mas fique atenta e olhe sempre bem para onde você pisa".
Levantei e fui seguindo o riozinho que reluzia por causa do reflexo do sol de fim de tarde. Segui o seu curso e ele foi se diluindo na grama até aparentemente desaparecer. No entanto, eu sabia que ele continuava ali, indo para onde ele tinha que ir - para um rio maior, que iria para outro rio maior, que iria para outro rio maior até chegar no oceano, leve o tempo que levar. Ele só estava indo por caminhos invisíveis e subterrâneos...
Nessa hora eu entendi qual era o recado que ele tinha a me dar: o de que nem sempre o silêncio significa inexistência. O rio continuava ali, apesar de não poder ser visto nem ouvido por mim.
Hoje estou indo de novo me calar para ouvir a natureza e a minha angúsita continua sendo a mesma: compreender o silêncio do rio e aprender a respeitar o silêncio dos outros.
Por que é tão difícil?

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Sobre fechaduras estragadas que não consertamos...

Já há um tempo, depois de compartilhar minha casa com outra pessoa por um bom período, me vi sozinha de novo. Minha primeira providência foi esvaziar a minha casa de qualquer memória que eu pudesse ter da pessoa que havia estado ali comigo por tanto tempo e de quem eu definitivamente não queria nenhuma lembrança.
Passei meses esvaziando o quarto. Todos os dias eu achava algum resquício que era imediatamente jogado fora ou doado: Eu queria estar só na minha casa, exclusivamente com a minha energia.
Depois de ter esvaziado um dos meus cômodos, me dediquei meses a fio transformando aquele lugar que antes era um depósito de recordações desnecessárias no meu santuário  - o lugar onde coloquei meu altar, minha estante com todos os livros que eu mais gosto, meu tambor, todos os meus tarôs, meu violão... Comprei um tapete colorido onde espalhei almofadas confortáveis, comprei persianas novas de bambu, só não pendurei uma reprodução de um quadro do Van Gogh que eu adoro por causa da minha mania de deixar coisas importantes para depois...
É sobre essa mania de deixar coisas importantes para depois que fiquei pensando...
Já há alguns meses, todos os dias que eu chego em casa, vejo que meus cachorros entraram nesse quarto de meditação e mexeram no meu altar, ou destruíram meus patuás, ou fizeram xixi e cocô no tapete.
Toda vez que isso acontece fico brava e, ao mesmo tempo, me sinto culpada achando que eles estão simplesmente reagindo assim porque eu não dou atenção suficiente a eles. Há meses isso se repete, há meses eu tento ensiná-los que ali é um local sagrado e, portanto, proibido para eles e há meses eles continuam me desobedecendo.
O que eu não disse antes é que há meses a fechadura da porta está estragada e há meses, talvez anos, eu devesse tê-la consertado, mas não: me adaptei à porta estragada! Às vezes coloco uma toalha para ver se fica mais difícil para eles conseguirem empurrar a porta e abri-la. Escolhi uma toalha laranja porque é uma cor que traz muita energia positiva. Tive essa preocupação cromática, mas mantive a fechadura da porta como estava: estragada!
Hoje quando cheguei em casa a porta do meu quarto de meditação estava, como tem sido costume, aberta. Para minha surpresa, meus cachorros tinham feito cocô em todo o tapete! Claro que na hora fiquei muito brava e, mais uma vez, me senti culpada por não ter colocado o jornal na varanda como devia, por não ter saído para passear com eles de manhã. Fiquei com raiva dos cachorrinhos, me vitimizei mais uma vez...
Até que uma voz sensata dentro de mim me disse: "Por que você simplesmente não conserta a porta? Nada disso estaria acontecendo dia após dia se você tivesse consertado a fechadura da porta assim que ela estragou". Simples assim!
Simples assim - a ponto de eu rir de mim mesma! E vejo que a gente nem sempre opta pela simplicidade, por cortar os males pela raíz. Cada um com seu motivo: alguns gostam de passar raiva, outros gostam de estar na posição de vitima, outros simplesmente tem uma dificuldade eterna para tomar decisões.
Fico pensando no início do meu texto, quando eu começo falando do processo de limpeza do meu quarto. E me lembro bem que demorei quatro anos para tomar uma decisão que eu devia ter tomado muito tempo antes! Os motivos pelos quais eu não conseguia simplesmente finalizar algo que já estava morto eram vários e não vêm ao caso agora. Muitas vezes ainda olho para trás com a sensação de tempo perdido.
Fato é que, depois de muito tempo, meu quarto sagrado é meu lugar preferido da casa e está completamente livre da energia de quem quer que seja. Ele é o meu lugar. Ele está livre da interferência energética de quem quer que seja, mas não dos cocôs dos meus cachorros ressentidos.
Agora só me restam duas opções: arrumar a fechadura e terminar com essa dor de cabeça diária ou me martirizar eternamente, além de deixar o tapete e as almofadas desbotadas por colocá-las na máquina de lavar roupas toda semana por causa desse inconveniente.
É... Definitivamente está na hora de consertar algumas fechaduras estragadas na minha vida...

sábado, 23 de julho de 2011

Sobre os amores líquidos...

Amores líquidos podem até me deixar molhada, mas a verdade é que eles não hidratam... Pelo contrário, ressecam.
Eu quero mesmo é a (h)UM(an)IDADE das lágrimas e da saliva... 
Eu quero mesmo é ser inundada e flutuar na água, depois do mergulho...

domingo, 10 de julho de 2011

Refletindo sobre reflexos no espelho.



Essa noite sonhei que entre mim e um falcão de penas cinzas havia um vidro espelhado. Nós tentávamos nos enxergar, mas o que víamos eram os nossos próprios reflexos na imagem distorcida do outro. Eu tentava me mostrar para ele, mas ele não conseguia me ver. Eu desenhava o meu rosto, passando as mãos nele, querendo que ele acompanhasse meu movimento, mas ele continuava vendo só a si mesmo. De repente uma mulher chegava e dizia para ele: "Você não consegue olhar para ela? Ela está ali, do outro lado do vidro!".
Achei tão simbólico e pensei logo nas relações que estabelecemos com os outros: tantas vezes não conseguimos enxergar o outro que está ali, se mostrando à nossa frente porque só conseguimos ver a nós mesmos espelhados nas barreiras invisíveis (o vidro frio) que criamos, seja lá por que motivo for.
Acordei triste e fiquei refletindo sobre esses reflexos de nós mesmos que nos cegam para enxergarmos o outro como ele realmente é, nos afastando assim da possibilidade do contato real com alguém que está bem à nossa frente...